A alegria de dar-se a Deus
“O que poderei retribuir ao Senhor Deus por tudo aquilo que ele fez em meu favor?” (Sl 115, 12). Com toda certeza, cada homem ou mulher neste mundo deve fazer esta pergunta a si mesmo, diante da infinita misericórdia de Deus que nunca nos abandona à nossa sorte ou permite que nossas vidas se distanciem da verdade e do amor, chegando a cumprir os mais impressionantes sacrifícios, e sendo impedido de chegar ao termo desta obra de salvação apenas pela livre vontade do ser humano, muitas vezes deturpada pelo pecado e incapaz de enxergar o bem que vem de Deus. Todos podemos e devemos fazer todo o esforço para agradecer e honrar o Senhor Deus por tantos seus benefícios em nosso favor. Contudo, existem alguns destes que têm motivos ainda maiores para louvar e agradecer profundamente a Deus. Os consagrados ao Senhor por amor ao Reino são homens e mulheres que, pecadores como todos os demais e redimidos pela Cruz salvadora de Cristo como todos os demais, são também escolhidos pelo Senhor para uma intimidade particularmente pro-funda nesta vida, em vista da plena comunhão do ser na eternidade.
Em virtude deste chamado especial recebido, os consagrados são aqueles que, em primeiro lugar, devem se colocar diante de Deus com o coração repleto de alegria espiritual para agradecê-lo, com todas as forças da alma, por esse estado de vida que, ao mesmo tempo em que exige, favorece a santificação através de uma união particular com o Senhor e uma mais intensa configuração com a Igreja, corpo místico e esposa de Cristo. Desta forma, a vida consagrada se torna uma oferta realizada por toda a Igreja na pessoa daquele ou daquela que acolhe de forma amorosa e doada ao chamado do Senhor e oferece, na Igreja e junto com a Igreja, a própria vida como sacrifício de louvor e agradecimento. Assim sendo, a entrega que faz o consagrado possuí sua origem e seu fim no Cristo Senhor, pois nasce do chamado realizado por Deus para o seguimento e a intimidade, e desemboca na oferta realizada com amor e reconhecimento da grandeza e da misericórdia, que não impede ninguém de adentrar no seu coração sagrado, mas que também chama os que deseja para lhe fazerem companhia e se unirem a ele em perene doação pelo mundo ao Pai.
Destarte, aquilo que forma e envolve a oferta da vida consagrada oferecida a Deus com amor não pode ser outra coisa que não a alegria, mas não apenas uma alegria humana, fruto de uma complacência com o conseguimento de algo que supere as próprias expectativas de vida e futuro, mas a alegria espiritual que nasce do coração que não se pertence mais, mas que já se consumiu em Deus, como o incenso que é queimado sobre o altar. Uma grande consagrada nos ensina: “A alegria deveria ser um dos aspectos principais da nossa vida consagrada. Quem dá com alegria dá muito. A alegria é o sinal distintivo de uma pessoa generosa e mortificada, que, esquecendo-se de todas as coisas e até mesmo de si mesma, procura agradar a Deus em tudo aquilo que faz pelas almas. Muitas vezes, esta alegria se torna uma espécie de manto que esconde uma vida de sacrifício, de contínua união com Deus, de fervor, de generosidade” (Santa Teresa de Calcutá, Instruções).
A alegria na vida consagrada, assim vista, não é uma opção mas uma verdadeira exigência do amor. Sabemos o que significa estar apaixonado, quando o amo que se sente por alguém supera qualquer incompreensão ou desarranjo; sabemos que o amor consegue suportar todas as adversidades e todas as intempéries da vida (cfr. 1Cor 13, 4-7). Desta forma, a alegria dos consagrados deve refletir o amor com o qual estes servos da humanidade se doaram inteiramente a Deus, livre e espontaneamente. Não existe doação forçada. Se uma doação é feita através da força ou da obrigação ela poderá ser chamada de roubo, furto, mas nunca de doação. A entrega generosa da própria vida por toda a vida não é uma obrigação, que poderia comportar um castigo para o seu descumpridor. Muito pelo contrário! A consagração é um convite de amor, feito com carinho e atenção à pessoa convidada, e, assim sendo, deve ser respondido com amor.
“A alegria é amor, o resultado espontâneo de um coração ardente de amor. Se estamos cheios de alegria, a nossa lâmpada arderá pelos sacrifícios feitos por amor. E o esposo nos dirá: ‘Vinde, e tomai posse do reino preparado para vós’” (Santa Teresa de Calcutá, Instruções). Com esta disposição aqueles que são chamados à vida consagrada e aqueles que já deram seu sim à este caminho de amor e sacrifício, oferecem a Deus o perfume da doação da própria vida, deixando-se ser unidos ao Cristo com tudo o que são e envolvidos por ele com tudo o que ele é.