O suave perfume da Ressurreição
O grandioso mistério de Cristo se realiza nos três dias sagrados de sua paixão, morte e ressurreição. São dias intensos de manifestação de tudo aquilo que o Senhor veio trazer à humanidade e que nunca deixou de doar. São dias em que a criação se reencontra de maneira nunca antes vista com o seu Criador; dias de uma tal proximidade entre o céu e a terra que não se viam desde os tempos de Adão, pois agora é o próprio Filho, no sinal excelso da cruz que suspende o corpo do Salvador, a unir o que o pecado fragmentou e a sanar o que o mal deteriorou.
A realização da hora de Jesus, como ele mesmo a chamou, na qual a dor e a morte se tornam meios de salvação e redenção, se expande no universo como um unguento livrador, como um óleo de eleição que não se deixa vencer em eficácia e maestria. Esta salvação de Cristo se difunde em toda a criação como um perfume suave e intenso, daqueles diante dos quais é impossível permanecer indiferente.
Do rei cantado com honras no salmo 44, o poeta sacro afirma: “Exalam vossas vestes perfume de mirra, aloés e incenso” (v. 9). São os aromas da realeza, que denotam a importância daquele que os conserva, não somente para si, mas principalmente para os que se aproximam e podem deliciar-se com eles. A partir desta compreensão, se torna clara a intenção da Divina Providência quando inspira a Nicodemos, o noturno discípulo de Jesus, a levar para a sepultura do Mestre Galileu mais de trinta quilos de perfumes.
“Acompanhou-o Nicodemos (aquele que anteriormente fora de noite ter com Jesus), levando umas cem libras de uma mistura de mirra e aloés” (Jo 19, 39). Em primeiro lugar se deve dizer que este não era um hábito usual dos judeus na preparação dos cadáveres para o sepultamento, e muito menos pensável que se pudesse pretender o uso de uma tão grande quantidade de aromas. A cena da sepultura de Jesus revela um plano divino manifestado nos sinais externos e na cooperação inspirada dos homens. O perfume a ser usado para embalsamar o corpo inerte de Cristo, assim como aquele usado pelos reis de então, conversa-se junto a ele para o proveito nosso, ou seja, de todos os homens e mulheres, de todos os tempos e lugares, que se aproximam daquele que por nós morreu, antes, que ressuscitou e está a direita de Deus (cfr. Rm 8, 34).
Tal símbolo se liga diretamente a um outro sinal que João faz notar, e que a nós pode passar quase despercebido: os panos que envolveram Jesus no sepulcro. No episódio da ressurreição de Lázaro (Jo 11, 1-45), depois que aquele que estava morto ter sido recolocado em vida por Jesus, diz-se que saiu do sepulcro envolvido com faixas, que no texto original em grego são chamadas keiria, que eram pedaços de tecidos usados para esse fim. Na narração do sepultamento de Jesus, o evangelista afirma que o seu corpo foi envolvido com panos, onde o texto original usa o termo othonion, que era o nome de um tecido específico e mais nobre, usado para a fabricação dos lençóis destinados ao leito nupcial. Vemos assim, que o sacrifício de Cristo não traz em si nenhum elemento de morte, como poderíamos entender partindo dos nossos conceitos e categorias demasiado humanos. A sua morte é, na realidade, realização de vida, de vitória sobre a decadência da morte e da destruição. É manifestação do amor indizível de Deus, criador e doador de toda a vida existente, que não se deixa nunca vencer pelo mal, mas o vence exatamente onde parece ser vencido.
A presença do caráter esponsal presente na morte e sepultura de Jesus se liga diretamente, através da abundância dos perfumes usados em seu corpo, com o matrimônio do Cordeiro e sua noiva – a Igreja –, no livro do Apocalipse: “Vi, então, um novo céu e uma nova terra, pois o primeiro céu e a primeira terra desapareceram e o mar já não existia. Eu vi descer do céu, de junto de Deus, a Cidade Santa, a nova Jerusalém, como uma esposa ornada para o esposo. […] ‘Vem, e mostrar-te-ei a noiva, a esposa do Cordeiro’. Levou-me em espírito a um grande e alto monte e mostrou-me a Cidade Santa, Jerusalém, que descia do céu, de junto de Deus, revestida da glória de Deus” (Ap 21, 1-2. 9-11). No sacrifício de Cristo, o amor de Deus se derrama sobre a humanidade renovada com toda a profusão, criando assim uma nova realidade, onde a morte não pode mais ter lugar, nem a dor poderio, mas apenas a presença do Ressuscitado ilumina as almas dos que foram redimidos.
A celebração da Páscoa do Senhor nos conduz à contemplação do mistério de Deus em sua maior e mais perfeita realização. Tudo o que o coração humano brama e anseia se encontra compendiado no mistério pascal de Cristo, onde nem as mais ardilosas armadilhas inimigas conseguem ofuscar a beleza do amor divino e a suavidade do seu perfume que exala salvação e liberdade em todo o universo.
Diante de tão grandioso mistério, somos nós convocados a unir nossa vida àquela do Redentor, fazendo-a tornar-se no mundo sinal do amor misericordioso de Deus e convertendo-nos em autênticos discípulos do Ressuscitado, prontos a espalhar seu perfume por toda a face da terra.